Este pequeno texto do Mestre Fernando Mendonça Heck, ilustra muito bem a magnitude dos problemas causados pelo uso abusivo e indiscriminado de venenos agrícolas.
As apostas da agricultura de
mercado territorializada na região, ocupando 80% das propriedades com grãos não
deve ser vista numa dimensão unívoca e economicista que afirma trazer essa o
desenvolvimento regional.
Muito se fala em produção de alimentos. Mas, a
realidade não é bem essa. O Oeste do Paraná produz sim soja e milho como base
da produção de ração para animais e exportação. E, além disso produz o que?
Isso é garantir alimento? As pessoas comem somente produtos de origem animal?
Seja como for há um problema muito importante a
ser mencionado. Milho, soja e cana que dominam grande parte das terras
agricultáveis do território nacional, são também responsáveis por 70% do consumo
de agrotóxicos do país (ROSA, PESSOA E RIGOTTO, 2011).
Essa utilização desenfreada de agrotóxicos se
reflete em dados como os divulgados pelo Instituto Paranaense de
Desenvolvimento Econômico e Social (IPARDES), que apontam a região de Cascavel
como campeã no consumo de venenos com 23Kg/Ha/ano (IPARDES, 2010). Isso
equivale a 5 vezes mais que a média nacional de consumo de agrotóxicos (4
Kg/Ha/ano) e duas vezes mais a média do estado que é de 12 kg/Ha/ano.
Isso significa que estamos em meio a índices muito
altos de utilização de venenos.
Por isso, é importante perguntar: é essa
agricultura que queremos? É esse modelo de produção de commodities que devemos defender? Penso que não.
O argumento dos ruralistas geralmente se baseia em
números do Produto Interno Bruto e da positividade da balança comercial. E
mesmo os governos tidos por alguns como “progressistas” continuam a apostar
nesse reducionismo economicista da produtividade para justificar a utilização
de agrotóxicos. Mas, podemos afirmar na perspectiva de Eduardo Galeano
(apresentada no documentário O Veneno
está na Mesa de Silvio Tendler), que a terra e as pessoas são muito mais
importantes do que os “numerinhos” da produtividade.
São tão mais importantes que é preciso debater os
efeitos dos agrotóxicos no ambiente. Este que inclui os seres humanos, os
animais, as águas, etc.
Entre 2007-2011 o glifosato foi o agrotóxico que
mais causou intoxicações relacionadas ao trabalho no Paraná. Os princípios
ativos de organofosforados resultou em 155 notificações por intoxicação e
dentre essas 85 estavam relacionadas aos metamidofós já proibidos (PAZ, 2012).
Alimentos como o abacaxi, alface, arroz,
beterraba, cebola, cenoura, couve, laranja, morango, pepino, pimentão, tomate e
repolho apresentam resíduos de agrotóxicos. Segundo o Relatório do Programa de
Análise de Resíduos de Agrotóxicos em Alimentos no Estado do Paraná (PARA), o
pimentão teve 100% das amostras consideradas insatisfatórias, seguido do pepino
com 75%, abacaxi, alface e morango com 50% e beterraba com 40%.
Nessa pesquisa, além de o pimentão ter a presença
de 20 ingredientes ativos não autorizados para esse cultivo em duas amostras
encontrou-se o endosulfan. Esse produto é proibido em 62 países no mundo. Em
2010 nos Estados Unidos ele foi banido por trazer risco inaceitável para
trabalhadores, vida aquática e terrestre, pássaros e mamíferos que consomem
organismos aquáticos onde o endosulfan pode ter sido acumulado (MOREIRAet al.,
2012). Também, os mesmos autores advertem que diversos problemas de saúde como
distúrbios do sistema nervoso central, doenças hepáticas, renais e
cardiorrespiratórias estão relacionadas à exposição crônica ao endosulfan.
Focamos agora no monocultivo da soja no Paraná. O
glifosato principal causador de intoxicações em trabalhadores no estado e
utilizado principalmente nas culturas de soja é considerado pouco tóxico. Mas,
há estudos que têm demonstrado efeitos negativos do glifosato sobre a
morfologia normal e a reprodução de minhocas expostas a esse agrotóxico. Outros
problemas de saúde relacionados são rinite, alterações do DNA/mutagêneses e
dermatites (PIGNATI et al. 2012). Isso que estamos falando de um agrotóxico
considerado pouco tóxico...
Assim, é preciso problematizar o modelo de
agricultura de mercado no Oeste do Paraná e no Brasil. Uma agricultura que se
assenta na produtividade, mas que traz tantos malefícios para o ambiente não
deve ser encarada como importante para a humanidade. Por isso é preciso saber
que quando se fala de agrotóxicos, estamos falando de agronegócio, de
monocultivo. Um modelo de agricultura que se ampara numa “revolução” (Revolução
Verde) que não conseguiu cumprir seu objetivo (se é que isso não foi apenas um lobby para convencer a sociedade), de
erradicar a fome no mundo.
Aliás, não consegue cumprir isso porque não é
interesse do agronegócio alimentar as pessoas. Seu objetivo é produzir para
auferir lucro e não produzir para alimentar a humanidade, já que segundo a
Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO) no mundo há
aproximadamente 870 milhões de pessoas que sofrem de subnutrição (AGÊNCIA
BRASIL, 2012).
Por isso, é preciso que saibamos ter inteligência
crítica para entender os agrotóxicos e sua relação com o capitalismo. É esse
modo de produção que vivemos que produz uma agricultura de mercado que não tem
o objetivo de produzir alimentos para os seres humanos, mas sim produzir para
lucrar. Realidade esta que está aqui no Oeste do Paraná.
Devemos defender essa agricultura de mercado? Ela
é importante para o conjunto da sociedade? Ou ela é importante para apenas
alguns que ganham muito com isso? Essas são perguntas urgentes que tem de
povoar nossas cabeças para que possamos construir alternativas!
Referências
INSTITUTO
PARANAENSE DE DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO E SOCIAL. Indicadores de
sustentabilidade ambiental por bacias hidrográficas do estado do Paraná.
Curitiba: IPARDES, 2010.
MOREIRA,
Josino Costa et al. Contaminação de águas superficiais e de chuva por
agrotóxicos em uma região do estado do Mato Grosso. Ciência & Saúde Coletiva, v.17, n.6, p.1557-1568, jun.2012.
ONU: quase 870
milhões de pessoas passam fome no mundo. Agência
Brasil. 09 out. 2012. Disponível em: <http://agenciabrasil.ebc.com.br/noticia/2012-10-09/onu-quase-870-milhoes-de-pessoas-passam-fome-no-mundo>.
Acesso em: 12 abr. 2013.
O VENENO ESTÁ
NA MESA. Produção de Silvio Tendler. (49 minutos e 23s.). Disponível em: <http://www.youtube.com/watch?v=8RVAgD44AGg>.
Acesso em: 12 abr. 2013.
PAZ, Sezifredo
Paulo Alves. Impactos dos Agrotóxicos no
Paraná e as ações da Secretaria de Estado da Saúde do Paraná. Apresentação
Seminário Internacional Contra os Agrotóxicos Pela Vida. Curitiba, 06 dez.
2012.
ROSA, Islene
Ferreira; PESSOA, Vanira Matos; RIGOTTO, Raquel Maria. Introdução: Agrotóxicos,
saúde humana e os caminhos do estudo epidemiológico. In: RIGOTTO, Raquel (org.)
Agrotóxicos, trabalho e saúde:
vulnerabilidade e resistência no contexto da modernização agrícola no Baixo
Jaguaribe/CE, Expressão Popular: 2011.
SECRETARIA DE
ESTADO DA SAÚDE DO PARANÁ. Relatório do programa de análise de resíduos de
agrotóxicos em alimentos no estado do Paraná (9º ano). Curitiba: SESP, 2011.
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